quinta-feira, 4 de setembro de 2014

Letra e Forja

Nunca escrevi uma história interessante. Não dessas grandes que ganham o mundo e contratos com estúdios e gravadoras. Escrevi umas poucas, algumas que pensei que serviriam para despertar algo de bom em quem as lesse e deixei-as escondidas de um curto tempo descobertas aos contemporâneos de sua composição. Coisas da vida, vivas enquanto presentes, esquecidas quando se tornam apenas memórias. Minhas personagens e os cenários eram pobres, as histórias, talvez, demasiado curtas e pobres de detalhes que pudessem mostrar alguma pretensão de ganhar luzes, sons, atores e prateleiras. Talvez houvesse um medo de fracassar naquele tempo, medo de perder tempo criando histórias que seriam lidas por poucos e guardei as poucas e curtas que fiz. Talvez. Possibilidade pesada, arrastada sulcando os caminhos que deixo atrás de mim. Penso que o talento não pode ser pretensioso, tampouco vaidoso, escrupuloso, medíocre, rasteiro, comum ou demasiadamente maleável. Coisas difíceis de conciliar. Minha literatura, então, encaminhou-se em outra direção, mais privada que as fantasias e livros grossos, feita de pedaços pequenos, fragmentações, que grosseiramente traduzem algum pensamento, experiência ou intenção de minha alma e de minha razão. O medo que dantes fizera para mim uma cortina de sombras atrás da qual pude esconder-me fez para mim um compêndio daquilo que outrora me fez esconder-me. A prudência do tempo, a espera, a angústia de cada composição, a intenção larga e curta, baixa e rasteira, luminosa, tudo isso forjou meu coração qual lâmina incandescida e moldada a marteladas, resfriada de súbito e passada a trabalhos menos grosseiros, menos duros, mas igualmente penosos.

Escrevi mais do que poderia prever quando arrisquei pela primeira vez. Olho para trás e vejo as sementeiras preparadas com os pesos arrastados até aqui. Plantadas, já portam ramagens novas e velhas, novos frutos, colheita iminente e esperas. Daquelas virtudes que previa pesadas trago ainda poucas, o desgaste do tempo ainda não mas pôde formar por completo, e faço da espera caminho, forja inevitável do tempo e do trabalho. Alguma pretensão eu tenho, alguma ambição, mas deixo-as em silêncio, silêncio que só a morte poderá livrar da força que minha fraqueza ainda faz para rompê-lo. Talvez seja essa a verdadeira virtude, uma disposição habitual ao combate, a resistência aos golpes, voltar à forja e deixar-se moldar, sempre.

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